terça-feira, 19 de setembro de 2017

O pepino torcido

Quanto mais se envelhece, menos tempo se tem de vida. Sim, mesmo que se morra no dia seguinte. O tempo acelera, um ano dura só um mês e uma década passa num só ano.
Que se há-de fazer? Geralmente acompanha-se com memórias da infância, das férias de Verão que nunca mais acabavam. Nessa altura um dia era uma eternidade. Era bom, não era? 
Mas não era. Quando somos pequenos estamos sempre à espera da coisa que se segue, que nunca mais vem. Perdemos tempo a pedir que tudo aconteça mais depressa e a chatear as pessoas que tomam conta de nós. O tempo é comprido por ser chato e por sermos impacientes.
O mal vem daí, da nossa meninice. Éramos pequeninos mas já perdíamos tempo como gente grande. É daí que vem a nossa incapacidade para viver no momento presente. Tanto faz sermos crescidos e chorarmos a falta de tempo como sermos crianças a chorar porque o tempo não passa.
Esperar é rejeitar o presente. É como olhar para os ponteiros do relógio. Não só não os faz andar mais depressa: também nos atrasa. São muitos os relógios disfarçados que andam para aí: écrans de todas as espécies em que os ponteiros são pessoas a fingir que são outras. Neles fixamos os olhos e, sem darmos por isso, a vida vai-se desligando da alma. Depois olhamos para um relógio verdadeiro e apanhamos o susto que merecemos.
Que horas são? Já chegámos? Quando é que acaba a viagem? Quando é que acaba a parte má e começa a boa? As perguntas das crianças são iguais aos remorsos dos velhos. Ambos são desperdícios inúteis.

MIGUEL ESTEVES CARDOSO,   PÚBLICO   02.09.17

domingo, 19 de julho de 2015

O FERREIRO


Havia um ferreiro que, após uma vida de excessos, resolveu consagrar sua vida a Deus. 
Durante muitos anos trabalhou com afinco, praticou a caridade, mas, apesar de toda sua dedicação nada parecia dar certo na sua vida. Muito pelo contrário: seus problemas e dívidas acumulavam-se cada vez mais. 
Uma bela tarde, um amigo que o visitara, e que se compadecia de sua situação difícil, comentou: 
- É realmente estranho que, justamente depois que você resolveu se tornar um homem temente a Deus, sua vida começou a piorar... Eu não desejo enfraquecer sua fé, mas apesar de toda sua crença no mundo espiritual, nada tem melhorado. 
O ferreiro não respondeu imediatamente. Ele já tinha pensado nisso muitas vezes, sem entender o que acontecia em sua vida. Entretanto, como não queria deixar o amigo sem resposta, encontrou uma explicação. 
Eis que o ferreiro disse: 
- Eu recebo nesta oficina o aço ainda não trabalhado e preciso transformá-lo em espadas. Você sabe como isto é feito? Primeiro eu aqueço a chapa de aço num calor absurdo, até que fique vermelha. Em seguida, sem qualquer piedade, pego no martelo mais pesado e aplico golpes até que a peça adquira a forma desejada. A seguir, mergulho a peça num balde de água fria e a oficina inteira enche-se com o barulho do vapor. Tenho que repetir esse processo até conseguir a espada perfeita; uma vez apenas não é suficiente. 
O ferreiro fez uma longa pausa, pensou e continuou. 
- Ás vezes, o aço que chega até mim não consegue aguentar esse tratamento. O calor, as marteladas e a água fria acabam por enchê-lo de rachaduras. E eu sei que jamais se transformará numa boa lâmina de espada. Então, eu simplesmente o coloco num monte de ferro-velho que você viu à entrada da oficina. 
Mais uma pausa e o ferreiro concluiu: 
- Sei que Deus me está colocando no fogo das aflições. Tenho aceite as marteladas que a vida me dá, e às vezes sinto-me tão frio e insensível como a água que faz sofrer o aço. Mas a única coisa que peço é: "Meu Deus, não desista, até que consiga tomar a forma que o Senhor espera de mim. Tente da maneira que achar melhor, pelo tempo que quiser, mas jamais me coloque no monte de ferro-velho das almas". 

     Deus quer fazer de si uma pessoa melhor... Não se preocupe com as marteladas da vida, ou as provas de fogo a que é submetido. Ele está trabalhando seu carácter. Ainda bem, que Ele nunca vai desistir de nós!

domingo, 12 de julho de 2015

UM PENSAMENTO...

Não acredite em algo simplesmente porque ouviu. Não acredite em algo simplesmente porque todos falam a respeito. Não acredite em algo simplesmente porque está escrito em seus livros religiosos. Não acredite em algo só porque seus professores e mestres dizem que é verdade. Não acredite em tradições só porque foram passadas de geração em geração. Mas depois de muita análise e observação, se você vê que algo concorda com a razão, e que conduz ao bem e beneficio de todos, aceite-o e viva-o.
Buda

SE EU MORRER ANTES DE VOCÊ

Se eu morrer antes de você, faça-me um favor:
Chore o quanto quiser,
mas não brigue com Deus por Ele haver me levado.

Se não quiser chorar, não chore.
Se não conseguir chorar, não se preocupe.
Se tiver vontade de rir, ria.

Se alguns amigos contarem algum fato a meu respeito,
ouça e acrescente sua versão.
Se me elogiarem demais, corrija o exagero.
Se me criticarem demais, defenda-me.
Se me quiserem fazer um santo, só porque morri,
mostre que eu tinha um pouco de santo,
mas estava longe de ser o santo que me pintam.
Se me quiserem fazer um demónio,
mostre que eu talvez tivesse um pouco de demónio, 
mas que a vida inteira eu tentei ser bom e amigo.

Se falarem mais de mim do que de Jesus Cristo, 
chame a atenção deles.
Se sentir saudade e quiser falar comigo, 
fale com Jesus e eu ouvirei.
Espero estar com Ele o suficiente 
para continuar sendo útil a você, lá onde estiver.
E se tiver vontade de escrever alguma coisa sobre mim,
diga apenas uma frase:
– “Foi meu amigo, acreditou em mim
e me quis mais perto de Deus!”
– Aí, então, derrame uma lágrima.
Eu não estarei presente para enxugá-la, mas não faz mal.
Outros amigos farão isso no meu lugar.
E, vendo-me bem substituído,
irei cuidar de minha nova tarefa no céu.

Mas, de vez em quando,
dê uma espiadinha na direcção de Deus.
Você não me verá, mas eu ficaria muito feliz
vendo você olhar para Ele.
E, quando chegar a sua vez de ir para o Pai,
aí, sem nenhum véu a separar a gente,
vamos viver, em Deus,
a amizade que aqui nos preparou para Ele.

Você acredita nessas coisas?

Então ore para que nós vivamos
como quem sabe que vai morrer um dia,
e que morramos como quem soube viver direito.

Amizade só faz sentido se traz o céu
para mais perto da gente,
e se inaugura aqui mesmo o seu começo.

Mas, se eu morrer antes de você,
acho que não vou estranhar o céu…
“Ser seu amigo… já é um pedaço dele…”

Padre Zezinho, Amizade talvez seja isso... São Paulo: Paulus Editora, 1988.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

GRANDES



Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto
Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.
Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes
Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.

Grandes são os desertos, minha alma!
Grandes são os desertos.

Não tirei bilhete para a vida,
Errei a porta do sentimento,
Não houve vontade ou ocasião que eu não perdesse.
Hoje não me resta, em vésperas de viagem,
Com a mala aberta esperando a arrumação adiada,
Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem,
Hoje não me resta (à parte o incômodo de estar assim sentado)
Senão saber isto:
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Grande é a vida, e não vale a pena haver vida,

Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar
Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem)
Acendo o cigarro para adiar a viagem,
Para adiar todas as viagens.
Para adiar o universo inteiro.

Volta amanhã, realidade!
Basta por hoje, gentes!
Adia-te, presente absoluto!
Mais vale não ser que ser assim.

Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro,
E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito.

Mas tenho que arrumar mala,
Tenho por força que arrumar a mala,
A mala.

Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão.
Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala.
Mas também, toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas,
A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino.

Tenho que arrumar a mala de ser.
Tenho que existir a arrumar malas.
A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte.
Olho para o lado, verifico que estou a dormir.
Sei só que tenho que arrumar a mala,
E que os desertos são grandes e tudo é deserto,
E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci.

Ergo-me de repente todos os Césares.
Vou definitivamente arrumar a mala.
Arre, hei-de arrumá-la e fechá-la;
Hei-de vê-la levar de aqui,
Hei-de existir independentemente dela.

Grandes são os desertos e tudo é deserto,
Salvo erro, naturalmente.
Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!

Mais vale arrumar a mala.
Fim.


Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

quarta-feira, 8 de julho de 2015

AS MÃES

Quatro mães católicas estão tomando um chá. A primeira mãe, querendo impressionar as outras diz:
- Meu filho é padre. Quando ele entra em qualquer lugar todos se levantam e dizem: "Boa tarde, Padre!"
A segunda mãe não fica para trás e comenta:
- Pois meu filho é bispo. Quando ele entra em uma sala, com aquela roupa, todos param o que estão fazendo e dizem: "Sua bênção, Bispo!"
A terceira mãe, calmamente, acrescenta:
- Pois o meu é cardeal.
Quando entra em uma sala todos se levantam, beijam o seu anel e dizem: "Sua bênção, Eminência!"
A quarta mãe permanece quieta...
Então, a mãe do cardeal, só para provocar, pergunta:
- E o seu filho, não é religioso?
A quarta mãe responde:
- Meu filho tem 1,90 m, é bronzeado, com olhos verdes e pratica musculação. Quando entra numa sala, todo mundo olha e diz:
MEEEEEEEUUUUU DEEEUUUUSSSS!!!

terça-feira, 7 de julho de 2015

25 ANOS

É hoje!
Faz 25 anos que comecei.
Mas é hoje, tem de ser hoje...
É sempre tempo de recomeçar.
E para não perder mais tempo
tem mesmo de ser hoje.
Ontem não fui capaz....
Amanhã não sei se cá estarei.
Por isso, é hoje!

Se olho para trás?
Sim, olho.
E agradeço!
E arrependo-me...
E recomeço!

Se olho para a frente?
Também olho!
Tanto quanto sou capaz!
E por isso quero recomeçar!
Hoje!

E hoje agradeço
A quem caminhou comigo,
a quem me desafiou no princípio,
a quem guiou os meus primeiros passos
a quem me amparou nas minhas quedas
a quem tentou que eu fosse melhor,
a quem me seduziu para outros caminhos,
a quem nunca desistiu de mim
a quem sempre esteve a meu lado
a quem me fez sentir útil
a quem me fez reconhecer que errei
a quem se aproveitou de mim
a eu tentei ajudar
e a quem ajudei mesmo...

ÁQUELE esteve sempre a meu lado!

Também me arrependo
de muitas, muitas coisas mesmo...
Afinal não foi um caminho fácil.
Mas estou cá
pronto a recomeçar...

Sei que ainda vou cair muitas vezes
Errar a direcção do caminho a seguir
e talvez apontar na direcção errada...

Mas
Continuo a confiar
porque muitos continuam a confiar em Mim
E sei que Ele não me vai abandonar
mesmo quando der passos mal andados
no caminho que me chama a seguir.

Quero recomeçar
Quero confiar que sou capaz
não sozinho
não sem Ele...
Não sem quem caminha comigo.

Por isso aqui estou
pronto para seguir em frente
pronto a dizer outra vez sim
e outra vez não
e seguir adiante
procurando ser útil ainda
e levar um pouco de alegria
um pedaço de esperança
uma mão cheia de fé
aos que encontrar no caminho
por onde for chamado a seguir.

E hoje é aqui que estou!
É aqui que dou graças
E aqui que peço
Que Deus vá diante de mim
E me conduza por onde quiser
que eu siga os seus passos.

7 de julho de 2015